O projeto de
lei do novo Plano Diretor, encaminhado pela Prefeitura de São Paulo à Câmara
Municipal, traz algumas diretrizes e propostas muito importantes para a cidade
como, por exemplo, a priorização do transporte público para a mobilidade
urbana, a reorganização das densidades da cidade de acordo com os eixos de
transporte coletivo de massa e o reequilíbrio dos usos no território entre a
oferta de trabalho e o local de moradia.
Entretanto,
tal como está formulado, o plano corre o risco de reiterar o histórico padrão
de segregação urbana na cidade de São Paulo. Não são introduzidos instrumentos
claros de ruptura com a lógica da produção de periferias e da expansão urbana
predatória, que pressiona os mananciais e áreas ambientalmente sensíveis, e
também não são contemplados adequadamente os grupos urbanos mais vulneráveis, a
população de menor renda e o comercio de pequena escala.
A proposta do
novo Plano Diretor ainda não supera o paradigma do automóvel, ao ignorar os
modos não motorizados como possível padrão de mobilidade, assim como não
contempla a heterogeneidade e diversidade dos territórios da cidade, ao
considerar apenas os potenciais construtivos e os usos como elementos
balizadores do seu processo de transformação.
Favorece,
assim, um olhar tecnicista e econômico aliado a grandes investimentos na
cidade, com pouca ou quase nenhuma atenção a seus aspectos culturais, afetivos
e educativos, e de uso dos espaços públicos, que hoje demarcam os territórios
urbanos com novas práticas sociais.
O Plano
Diretor em discussão propõe áreas mistas mais adensáveis ao longo dos eixos de
transporte coletivo, mas pouco avança nas formas de transformar o adensamento
construtivo em adensamento populacional de maneira heterogênea e includente,
respeitando as especificidades socioculturais e ambientais das diferentes
partes do território.
A
democratização da gestão da cidade – entendida como ampliação da esfera
decisória dos projetos políticos e do controle social de sua implementação – e
o efetivo cumprimento da função social da propriedade ainda são lacunas a serem
superadas pela proposta do Plano Diretor, que não define as formas de controle
e participação social, sobretudo nos principais instrumentos de intervenção na
cidade.
Finalmente, o
plano não prevê dispositivo específico para salvaguardar direitos de população
de baixa renda e submetida a situações de vulnerabilidade no caso de remoções
forçadas decorrentes de obras e políticas públicas, ao não introduzir
dispositivos que melhorem as condições de vida das populações atingidas.
O
Movimento/Coletivo pelo Direito à Cidade no Plano Diretor de São Paulo, aqui
constituído, reivindica a inclusão das propostas descritas na plataforma
detalhada a seguir:
PROMOVER A
DEMOCRATIZAÇÃO, DIVERSIFICAÇÃO E EQUILÍBRIO SOCIOAMBIENTAL NO PROCESSO DE
TRANSFORMAÇÃO DA CIDADE
INCLUSÃO SOCIOTERRIOTRIAL NOS
EIXOS DE ESTRUTURAÇÃO DA TRANSFORMAÇÃO URBANA
- Demarcação das Zonas
Especiais de Interesse Social (ZEIS) e autoaplicabilidade da Cota de
Solidariedade de forma a garantir no mínimo 30% do potencial construtivo
previsto para os Eixos de Estruturação da Transformação Urbana para
Habitação de Interesse Social (HIS);
- Garantia do
reassentamento das populações atingidas pelas intervenções de transporte
público dentro do perímetro dos Eixos;
- Desestímulo do avanço
da ocupação nas áreas de mananciais através da delimitação de parques e
áreas de proteção, de incentivos à usos compatíveis com a produção de
água, da delimitação de área rural e por meio da delimitação de ZEIS e
aplicação da Cota de Solidariedade nos eixos que atravessam a Macrozona de
Proteção e Recuperação Ambiental;
- Estratégias para
garantir existência de áreas livres dos eixos de adensamento e cotas para
espaço público;
- Criação de
instrumentos que garantam a utilização dos espaços públicos às atividades
socioculturais e ambientais locais, ao pequeno comércio e ao comércio
ambulante;
- Restrição aos grandes
empreendimentos comerciais – dependentes de automóveis – e estímulo ao
pequeno comércio;
- Restrição total as
vagas de estacionamento;
- Diferenciação dos
padrões de ocupação dos eixos de acordo com as macroáreas, a capacidade de
suporte dos modais de transporte e as características urbanísticas,
culturais e ambientais existentes nos territórios pelos quais atravessa.
REGULAR AS
ÁREAS NÃO CONTIDAS NOS EIXOS DE ACORDO COM AS DIRETRIZES GERAIS DA POLITICA
URBANA
CONTROLE DO PROCESSO DE
TRANSFORMAÇÃO NA CIDADE
- Fim dos instrumentos
urbanístico de exceção tais como Concessão Urbanística e Áreas de
Intervenção Urbana;
- Fim das áreas não
computáveis para efeito do cálculo do coeficiente de aproveitamento;
- Utilização do Fator de
Planejamento por uso, de acordo com os diferentes objetivos, no cálculo da
Outorga Onerosa;
- Regramento para associar
o uso de potencial construtivo adicional à produção de espaço público e
habitacional;
- Previsão de zonas
especiais para pequeno comércio e perímetros específicos nos espaços
públicos para o comércio ambulante;
- Controle do tamanho
máximo das áreas e das frentes comerciais;
- Garantia da
autoaplicabilidade dos instrumentos urbanísticos que visem o cumprimento
da função social da terra como IPTU Progressivo no Tempo, PEUC, Instituto
do Abandono.
- Exigência de aumento
de áreas permeáveis em grandes empreendimentos e estacionamentos
(existentes e novos);
- Revisão da dispensa do
Estudo de Impacto de Vizinhança em caso de realização do Estudo de Impacto
Ambiental;
PRIORIZAR O
ATENDIMENTO HABITACIONAL DA POPULAÇÃO DE 0 A 3 SALÁRIOS MÍNIMOS
- Revisão dos
percentuais destinados às diferentes faixas de renda nas ZEIS – de acordo
com o déficit do município – e atendimento público prioritário à faixa de
renda mais vulnerável (0 a
1 S.M.
- Dividir a Faixa 1 em 1A (0 a 1 S.M.) e 1B (1 a 3 S.M.), a fim de se
garantir o atendimento e a definição de demanda para a faixa de renda mais
vulnerável;
- Ampliar a destinação para HIS em todas as ZEIS, de acordo com o
déficit habitacional do município;
- Retirar HMP de ZEIS 1 e 4, já que estas ZEIS tem como função a
manutenção da população residente, cuja renda não ultrapassa o limite de 6
S.M.;
- Incluir um percentual mínimo para ‘outros usos’ a fim de
garantir a manutenção do pequeno comércio nas áreas ocupadas.
- Definição de uma
política habitacional de locação social específica para a população de
renda mais baixa e assentados em logradouros e praças pública;
- Regulamentação do
instrumento da Cota de Solidariedade para produção e HIS;
- Respeito ao direito de
posse dos moradores de assentamentos informais, inclusive nos processos de
remoção;
- Estabelecimento de
normas de uso e ocupação do solo que garantam a existência de espaços
socioprodutivos nos EHIS e promovam a diversificação de usos em seu
entorno.
PRIORIZAR
PEDESTRES, CICLISTAS E USUÁRIOS DE TRANSPORTE COLETIVO
- Estímulo à
reestruturação da rede de transporte público de modo a promover ligações
entre bairros;
- Instituir órgão
responsável pela formulação e implementação da política para veículos não
motorizados e pedestres;
- Garantir a circulação
segura de bicicletas e outros veículos não motorizados em todas as vias da
cidade, seja através de construção de infraestrutura específica ou da
promoção de medidas que facilitem o compartilhamento com os demais veículos;
- Definição no Plano
Diretor de uma rede estrutural de transporte cicloviário articulada aos
demais modais de transporte urbano, equipamentos públicos e centralidades;
- Definição de
diretrizes, componentes e ações estratégicas para o sistema de circulação
de pedestres;
- Garantia de fonte de
recursos para implementação de infraestrutura cicloviária e de pedestres
(FUNDURB e/ou FMDT)
- Desestímulo ao uso do
automóvel com a restrição de vaga de garagem, consolidação dos corredores
e faixas exclusivos de transporte público, política de restrição de
estacionamento em vias e definição dos estacionamentos como áreas
subutilizadas.
AVANÇAR NA
PARTICIPAÇÃO E NA EFETIVIDADE DO CONTROLE SOCIAL
Existem
muitos espaços participativos, mas poucos espaços de caráter decisório de fato
e pouco controle social. Neste sentido, faz-se necessário:
- Garantia do espaço de
participação nos processos decisórios, inclusive na definição das pautas
particularmente no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano;
- Transparência e
controle social dos conselhos de gestão dos fundos, particularmente
FUNDURB e conselhos de Operações Urbanas com composição paritária e maior
participação da sociedade civil;
- Assessoria técnica
independente para os conselhos para apoiar os conselheiros da sociedade
civil; e divulgação didática prévia de todo o conteúdo dos projetos
- Ampliação da
participação social na composição dos conselhos participativos;
- Ampliação de acesso à
informação
- Previsão da
exigibilidade de Estudo de Impacto Social em obras de infraestrutura,
projetos de regularização fundiária e urbanística, e outras intervenções
que provoquem deslocamento de moradores, alteração do perfil de bairros e
outros impactos significativos;
- Obrigatoriedade de
formação imediata de Conselhos Gestores desde a etapa de elaboração do
projeto sempre que houver qualquer intervenção, pública ou privada, sobre
os perímetros de ZEIS 1.
- Criação de instâncias
de integração e articulação das políticas setoriais, das políticas
públicas e prestadoras de serviços e dos representantes nos diversos
conselhos da cidade em Núcleos Regionais de Planejamento abertas à
participação de toda população.
- Estabelecer formas de
controle popular sobre as Parcerias Público Privadas em todas as formas
dessa associação, com ampla participação das populações afetadas.
Assinam este documento:
Arquitetura
da Gentrificação
Associação Anjos da Paz
Associação Conde de São Joaquim
Associação dos Moradores da Comunidade Pantanal Zonal Sul
Associação dos Moradores e Amigos da Santa Ifigênia e Luz – AMOALUZ
Associação dos Movimentos de Moradia da Região Sudeste
Associação Estrela Guia da Região Sudeste
Associação Habitação e Dignidade – AHD
Associação Nova Heliópolis
Bike Anjo São Paulo
Central de Movimentos Populares - CMP
Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos – CGGDH
Cidades Para Pessoas
Coletivo Perifatividade
Coletivo Prestando Contas
Conselho Gestor da ZEIS 3 C
016 Sé: Representantes da moradia
Ciclo ZN
Ciclocidade – Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo
Defensoria Pública do Estado de São Paulo – Núcleo de Habitação e Urbanismo
Escritório Modelo – Dom Paulo Evaristo Arns (PUC São Paulo)
Fórum de Ambulantes da Cidade de São Paulo
Fórum Suprapartidário por uma São Paulo Saudável e Sustentável
Frente de Luta pela Moradia – FLM
Grupo de Articulação De Moradia Para o Idoso da Capital – GARMIC
Instituto de Lutas Sociais – ILS
Instituto CicloBR de Fomento à Mobilidade Sustentável
Instituto Pólis
Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos – LabHab (FAU-USP)
Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade – LabCidade (FAU-USP)
Mootiro Maps
Movimento Apropriação da Luz
Movimento de Defesa Do Favelado – MDF
Movimento de Habitação e Ação Social – MOHAS
Movimento de Moradia da Cidade – MMC
Movimento de Moradia da Região Centro – MMRC
Movimento de Moradia Para Todos – MMPT
Movimento Nacional da População De Rua
Movimento Nacional de Luta Pela Moradia – MNLM
Movimento Sem Terra Leste 1
Movimento Sem Teto da Zona Oeste e Noroeste
Movimento Sem Teto do Heliópolis
Pedal Verde
Secretaria Executiva da Rede Nossa São Paulo
União dos Movimentos de Moradia – UMM
União dos Movimentos de Moradia Independente da Zona Sul – UMMZIS
União Independente da Zona Sul – UIZ SUL1
Unificação das Lutas De Cortiços E Moradia – ULCM